16 de abr. de 2010

A ruptura interior

Mas, continua a narrar o Génesis, Adão e Eva pecaram.
Opuseram-se a Deus e encerraram-se na soberba de querer ditar as regras do bem e do mal.
Ao perder essa inocência e essa generosidade plenas do coração em relação a Deus, perderam também a integridade interior da sua própria pessoa.
A generosidade já não reinava no seu coração.
Por isso se manifestou o egoísmo nas suas relações mútuas.
Com efeito, diz a Bíblia que, só depois de pecar, "viram que estavam nus , e fizeram uns cinturões com folhas"
(Gen 3,7).

Que quer dizer "viram que estavam nus"?
Porque estiveram nus toda a vida até aí:
"Estavam os dois nus, o homem e a sua mulher, sem envergonhar-se um do outro"
(Gen 2,25).
O que quer dizer é que já não dominavam o seu corpo, que o seu corpo já não era a expressão perfeita de uma alma generosa e enamorada.

O egoísmo da alma traduziu-se no egoísmo do corpo.
A ruptura da alma com Deus trouxe consigo a ruptura com o corpo, a sua rebelião em relação à alma.
Por isso, a sua sexualidade deixou de ser expressão de uma generosidade e entrega que tinham perdido.
Adão e Eva deram-se conta de que já não se viam com a mesma inocência de antes.

Antes tinham sido criados como marido e mulher, mas a sua sexualidade era sempre e só amor, entrega mútua.
Agora descobrem que experimentam o corpo do outro, não só como expressão da sua pessoa, mas também como mero objecto sexual que satisfaz o instinto descontrolado. Por isso têm vergonha e cobrem-se com uns cinturões com folhas, para dissimular os aspectos estritamente sexuais do seu corpo.

Antes, a nudez era sinónimo da generosidade que reinava na sua alma, agora pode provocar uma resposta egoísta e animal, que envergonha.
E isso sucede-lhes a eles que, nesse momento, não tinham no seu passado nem um pecado de impureza, só o pecado original da soberba.

Mas com a ruptura interna provocada pelo pecado, para preservar o carácter pessoal do corpo, para poderem apresentar-se como pessoas e não como simples objectos sexuais, havia que dissimular o estritamente sexual.
Porque nem um nem outro têm já esse domínio total do corpo que permitia aquela absoluta naturalidade de antes. A descrição do Génesis narra de modo claro e adequado essa experiência que todos temos de um fator de desordem e descontrolo na nossa sexualidade.

Aparece assim o pudor, a defesa instintiva do carácter espiritual e pessoal da intimidade corporal.
O corpo continua a ser expressão da pessoa, da intimidade do espírito.
Mas agora essa capacidade de expressão não é algo já conseguido, mas tem de alcançar-se mediante o exercício da própria liberdade.

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